Grupo Ouro & Prata investe na inovação (publicado pelo Diário do Transporte – 02.03.2020)

Grupo Ouro & Prata investe na inovação compartilhada em busca de novas maneiras de pensar soluções para o transporte rodoviário de passageiros

Foco no cliente precisa evoluir para compreender desejos e necessidades; empresas devem buscar um benefício como um todo, oferecendo outras coisas além do próprio transporte

ALEXANDRE PELEGI – Diário do Transporte
Entrevista com Luana Araujo Fleck – ABRATI/Empresa Ouro e Prata

Luana Fleck, uma jovem empresária antenada com o tema da inovação no transporte rodoviário de passageiros, pertence à terceira geração do Grupo Ouro e Prata, tradicional empresa de transporte do sul do país com oito décadas de história. Luana é diretora do Grupo e Vice Presidente da ABRATI – Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros.

Em conversa com o Diário do Transporte, ela relatou não só seus desafios no grupo empresarial, como ainda seu objetivo de realizar trabalhos compartilhados envolvendo outras empresas do segmento.

O Grupo Ouro e Prata recebeu, em 2018, o Prêmio Inovação ANTP/ABRATI e também foi considerada uma das 100+ Inovadoras no uso de TI em três edições, pela Revista IT Mídia em parceria com a consultoria PWC. A empresa atende mais de 200 destinos em vários estados e emprega em torno de 1.100 funcionários.

Luana tem claro que o transporte rodoviário de passageiros precisa inovar, não apenas como necessidade imperativa de mercado, como também para cativar e fidelizar os clientes atuais, e claro captar novos ingressantes.

Se antes o transporte aéreo era o grande concorrente do transporte rodoviário interestadual, hoje, mais que modos diferentes de transporte, o maior desafio do setor está na velocidade das transformações. E as alterações na regulamentação do setor de transporte conformam outro desafio que vem se somar aos muitos que já existem.

Em meio a tudo, o foco no cliente, razão de ser do transporte rodoviário e, a bem dizer, de qualquer atividade econômica produtiva.

SISTEMA ENXUTO

Mudar de dentro para fora, mas também buscar fora os estímulos para animar e orientar as mudanças internas, é uma busca que Luana Fleck decidiu fazer ao visitar não só experiências em outros países, como ainda em ramos de negócios distintos, como o setor do varejo.

“Busquei referências fora do setor de transportes de passageiros e busquei principalmente no setor do varejo, um setor muito mais avançado em relação a olhar as necessidades do cliente”, ela conta. “Uma das empresas que tenho como referência na sua visão do cliente é o Magazine Luiza, que possui uma digitalização muito grande e nela busquei a base de ação no varejo”, sintetiza a jovem executiva.

Ao mesmo tempo, a implantação da gestão dos conceitos Lean (enxuto, em inglês, baseado no sistema de gestão da Toyota), uma filosofia de trabalho que abrange todos os setores da empresa e mudou a maneira de pensar o “negócio”, acabou produzindo uma nova mentalidade interna na Ouro e Prata.

“Na gestão Lean busquei a melhoria de processos internos na digitalização. Estou focada em fazer uma preparação da empresa para o futuro e isto passa pela digitalização dos processos, o que inclui sua simplificação”, ela relata.

Nas muitas viagens que fez, Luana relata que teve muitos insigths e acabou focando na análise de dados, que foi um dos principais esforços da Ouro e Prata para obter e trabalhar as variadas informações a respeito de seus clientes. “Se o cliente compra pela internet ou se ele se conecta ao nosso wi-fi, nós recebemos seus dados e conseguimos identificá-lo, e desta forma trabalhar muito melhor. Sempre busquei ver o perfil do passageiro, sexo, idade, renda e profissão”, Luana descreve.

Mas se trabalhar a base de dados começou com o perfil do cliente, hoje Luana afirma que isso evoluiu. “Não vemos mais somente o perfil, mas sim o que o cliente gosta, quais suas preferências, quais páginas ele curte na internet, suas expectativas e preferências comportamentais, o que faz em seu tempo livre, mídias sociais que curte”, relata Luana

Mas ao começar a mudar a empresa por dentro, Luana percebeu que esta mudança só ganharia corpo e sentido se o corpo funcional tivesse contato com outras experiências de inovação. Não apenas de outras empresas, mas ainda de segmentos diversos, mesmo que atuando na mesma área.

HUB DE INOVAÇÃO

“O que eu vi ficou muito claro, e a partir daí o que fiz foi levar o pessoal da Ouro e Prata na área de inovação para o TECNOPUC (centro e inovação em RS na PUC). Dentro de um local nós criamos um hub do setor de transportes. Este hub é um local onde ficam algumas empresas ligadas ao setor e lá conseguimos desenvolver trabalhos pautados na inovação colaborativa. Esta parceria reuniu a Ouro e Prata, a Marcopolo, e mais as empresas Rodosoft e Innoscience, e a partir daí nasceu esse Espaço de Inovação dentro da Tecnopuc”.

O objetivo das empresas é unir clientes, fornecedores, colaboradores e parceiros para desenvolver conceitos e novas maneiras de pensar soluções para os problemas mais agudos do setor de transporte de passageiros.

“Desta forma, a transformação que estávamos fazendo dentro da empresa, avançou para o compartilhamento de ideias e propostas com outras áreas de produção. Ir para a TECNOPUC tirou a empresa da garagem e a levou em outro ambiente focado no futuro. Nos fez olhar o negócio com outros olhos”, ela afirma.

A aproximação com a Marcopolo, fabricante de carrocerias, começou até antes, com a implantação do sistema Lean, com a encarroçadora visitando e implementando o mesmo sistema na Ouro e Prata.

“O fato de a Marcopolo estar junto com a gente no Hub de transporte trouxe uma proximidade entre a empresa de ônibus que transporta o passageiro com o fabricante do veículo. A Marcopolo trata direto com os clientes sobre melhorias e modificações nos veículos. Ouvindo mais as empresas e desenvolvendo junto conosco, inclusive fazendo testes, todos saem ganhando. A começar do cliente que viaja conosco, a razão de todos nós existirmos”, conclui.

TECNOLOGIA EM FAVOR DO CLIENTE

“Hoje a gente já tem uma simplificação grande e o foco é simplificar processos e preparar a empresa para o futuro. Nós estamos olhando todos os processos e começando pela venda da passagem, que simplificou muito e com melhorias no site para que a aquisição seja simples. Implementamos o bilhete eletrônico, por exemplo”, Luana relata.

Ela conta que a tecnologia promoveu a facilidade na compra da passagem e no embarque, algo que agrega bastante comodidade ao passageiro, reduzindo o tempo de todo o processo, sem ele ter de pegar filas nos terminais.

“Quando a gente implantou este sistema de coleta de dados dos passageiros, nós também implantamos o programa de fidelidade que proporciona entender melhor o comportamento de preferências e compras dos nossos clientes”, Luana relata.

Uma nova forma de pagamento, aceitando pontos, foi outra inovação no setor de venda de passagens que a Ouro e Prata implantou. Numa parceria com a Livelo, uma das principais empresas de recompensas do Brasil, desde fevereiro deste ano os pontos gerados no Programa de Fidelidade Ouro e Prata passaram a ser automaticamente convertidos em pontos Livelo.

JORNADA DO CLIENTE

Um dos resultados do Hub de Inovação lançado na TECNOPUC foi o projeto “Jornada do Cliente”, em que foram envolvidos 45 profissionais das empresas que participaram. Foram realizadas 35 viagens para produzir o estudo, que ocupou os meses de setembro a dezembro de 2019.

A jornada é um conceito que se refere ao caminho que o cliente percorre desde o primeiro contato com a empresa até a concretização da compra ou fechamento do negócio. Na análise feita pelo grupo, incluiu-se o antes e o depois da viagem.

O objetivo foi mapear oportunidades de melhoria ao longo de toda experiência do cliente do transporte rodoviário. As atividades reuniram diversos atores importantes envolvidos na prestação do serviço.

Os profissionais das empresas de transporte, rodoviárias, encarroçador e associação de classe reproduziram os passos da jornada do cliente desde o início do planejamento até o pós-viagem para 7 perfis (personas) distintos.

A Jornada foi dividida em fazes, começando pelo planejamento da viagem (como chegar ao modo de viagem), a compra (pela internet, rodoviária, etc), até a fase propriamente dita da viagem e chegada ao destino final (como chegar em casa após desembarcar no destino)

Após o mapeamento da jornada e as dores envolvidas, foram geradas ideias para melhorar a experiência e tornar o serviço mais adequando às necessidades e desejos identificados. Após a priorização, foram definidas 15 iniciativas com diferentes graus de complexidade de execução, que, se implementadas, têm o potencial de entregar mais valor aos clientes do transporte de passageiros rodoviários.

Dentre as iniciativas desenvolvidas, uma ideia identificada como de difícil implementação, mas de alto impacto potencial, foi a de tornar o site das rodoviárias em um portal de venda de serviços.

Já a ideia de produzir uma Integração Inteligente (bus + conveniências), que vincularia o sistema de passagens a aplicativos de transporte, como Uber e 99, resolveria dois momentos importantes da Jornada do Cliente, a Pré-Viagem e a Pós-Viagem. Esta iniciativa foi classificada pelo grupo de trabalho como de médio impacto potencial e também médio grau de desenvolvimento.

Nessa iniciativa, ao comprar a passagem, o app recebe a informação do horário da viagem e já entra em contato com o passageiro para já agendar sua ida (ou saída) para a rodoviária e assim evitar atrasos.

Outra iniciativa, de alto impacto e fácil solução, foi a de permitir a compra de passagem com desconto na web para estudantes. Para isso, seria utilizada a identificação estudantil digital do governo na plataforma de compra.

SIMPLIFICAR PARA SER COMPETITIVO

Para Luana, as empresas de ônibus interestaduais e todas as empresas de transporte estão caminhando para uma integração de modais. “As empresas estão buscando um benefício como um todo, oferecendo outras coisas além do próprio transporte, que é o que a gente fez”, afirma Luana.

Para isso, ela acredita que um novo desafio está em ter uma empresa enxuta e moderna, que permita competir com automóveis que oferecem grupos de carona pela internet. “Estes grupos buscam em casa, levam em casa com valor menor e as empresas têm uma série de cargas como tributária, responsabilidade ambiental e segurança, o que não permite muitas vezes que sejamos tão competitivos no preço final como um grupo de carona, que não precisa de nada disso”, ressalta Luana.

Uma das saídas é a integração entre modos. “Estando integradas com outros modais as empresas conseguem ter ganhos e oferecer um serviço completo para o cliente (passageiro)”, ela conclui.

Para Luana, o transporte rodoviário hoje tem amplas condições não só de fidelizar seus clientes, como ainda de atrair novos usuários. Para isso, inovar é a palavra de ordem.

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